Morreu Augusto Carneiro, um dos ícones do ambientalismo gaúcho
Carneiro unia discurso à ação
Guilherme Kolling
“Aqui é tudo ecologia!” Esse era o bordão com que Augusto Carneiro
(foto) chamava a atenção de clientes que passavam em frente à sua banca
de livros na feira ecológica de sábado da avenida José Bonifácio, em
Porto Alegre. Logo mostrava títulos sobre o tema ambiental e, vendendo
ou não as publicações, distribuía propaganda ecológica – cópias de
reportagens, em sua maioria, com temas que iam da importância de manter
no solo as folhas secas que caem das árvores até o destino correto do
lixo.
Carneiro foi um incansável divulgador das causas ambientais no Rio
Grande do Sul. Mas o marcante, em sua trajetória, é que ele ia além do
discurso, colocava em prática o que dizia. Era um homem de ação.
Em 2001, fui ao seu apartamento na rua da República para uma
entrevista sobre o movimento ecológico gaúcho. Centenas de recortes de
matérias de jornais e revistas, encadernados em imensos álbuns, não
deixavam dúvidas sobre a atuação do grupo nas décadas de 1970 e 1980 –
campanhas contra a poda incorreta de árvores na Capital, a poluição da
fábrica de celulose da Borregaard, em Guaíba, ou a busca das causas do
que ficou conhecido como Maré Vermelha, na praia do Hermenegildo.
Mas havia outras mostras de sua dedicação além dos registros da
imprensa. Carneiro mantinha seis recipientes distintos para separar o
lixo doméstico em sua residência. Em outra peça da casa, mais um
exemplo: uma centena de exemplares do livro O Rio Grande do Sul e a
Ecologia, coletânea de textos de Henrique Luís Roessler, que combatia o
desmatamento e a poluição dos rios no Vale do Sinos nas décadas de 1950 e
1960. Carneiro reuniu os artigos e bancou a edição do livro.
Roessler inspirou Carneiro, que queria criar uma entidade ecológica.
Depois de várias tentativas, conseguiu, em abril de 1971, quando, com a
parceria de José Lutzenberger e Hilda Zimmermann, fundou a Associação
Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan).
Secretário, tesoureiro, cobrador – eram mais de mil sócios em dia –,
Carneiro assumia múltiplas tarefas na Agapan. Conseguiu até uma sede na
Rua da Praia, onde ocorriam reuniões com palestras de Lutzenberger.
Enquanto Lutz participava de debates, redigia artigos e concedia
entrevistas, Carneiro organizava tudo, participava de ações de rua e
fazia divulgação. “O noticiário era todo nosso, porque, durante a
ditadura, havia censura à cobertura política ou qualquer tipo de
protesto, então, ganhávamos um baita espaço. Eles não nos consideravam
subversivos. Mas nós éramos”, costumava dizer.
É difícil mensurar o legado deixado por Carneiro, que morreu ontem,
aos 91 anos. Mas, certamente, pode-se dizer que ele deu uma contribuição
importante para que Porto Alegre seja uma cidade bem arborizada. A
consciência ambiental da população também é um dos seus frutos.
Recentemente, ativistas subiram em árvores para evitar o corte –
gesto que já ocorrera em 1975, quando a Agapan e estudantes conseguiram
impedir a derrubada de árvores na avenida João Pessoa. Agora, a cidade
acompanha a luta pela instituição do Parque do Gasômetro – Carneiro
participou de campanhas que resultaram na criação dos parques do Delta
do Jacuí, na Capital, de Itapuã, em Viamão, e da Guarita, em Torres.
Seriam necessárias várias colunas como esta para retratar a
contribuição de Carneiro como ecologista, livreiro – participou da
primeira Feira do Livro de Porto Alegre – e defensor do naturismo.
Assim, deixo duas sugestões de leitura: Augusto Carneiro, depois de tudo
um ecologista, de Lilian Dreyer (PeloPlaneta/Scortecci Editora, 2013), e
Pioneiros da Ecologia, de Elmar Bones e Geraldo Hasse (JÁ Editores,
2007).
Coluna publicada em 08/04/2014 no Jornal do Comércio/RS
Link para a matéria no Jornal do Comércio: http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=158751
FONTE: REDE Os Verdes/via Facebook- Gonçalo de Carvalho
FONTE: REDE Os Verdes/via Facebook- Gonçalo de Carvalho